Recentemente, a Aneel informou que o Brasil apresenta uma “sobra” de energia. Os projetos de geração aprovados pela agência são suficientes para mais do que duplicar a capacidade instalada do país.
Com toda essa oferta, os preços de energia ainda deixarão os projetos atrativos?
TLDR: Embora as previsões sejam de dobrar a capacidade instalada de energia no país, o mercado livre de energia atende hoje uma pequena parcela dos consumidores. A previsão é que o mercado livre triplique de tamanho até 2028. Aliado a isso a maior migração das empresas para o mercado livre manterão o preço de energia competitivo e os projetos viáveis.
Brasil avança em direção à liderança de energias renováveis.
Dados da Aneel mostram que o Brasil apresenta mais de 190 GW, dos quais aproximadamente 83% são provenientes de fontes renováveis. No primeiro trimestre, dados do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) indicam que esses números chegaram a 90%. Quando comparado a outros países do mundo, o Brasil passa a figurar como segundo país com maior percentual, em energia renovável em sua matriz, ultrapassando assim a Nova Zelandia.

Figura 1 – Percentual de Energia renovável na Matriz energética em 2021 – https://yearbook.enerdata.net/renewables/renewable-in-electricity-production-share.html
A associação de energia eólica Abeeólica apresenta ainda boas perspectivas. Existem 150GW através de 3.000 projetos eólicos e solares aguardando autorização da Aneel ou do ONS para acessar a rede de transmissão brasileira.
A inclusão desses novos projetos na matriz atual, elevariam a capacidade instalada do país a 340GW, permitindo que o Brasil ultrapasse gigantes como Alemanha (250GW), Rússia (282GW) e Japão (334GW)4.
Geração Distribuída amplia a concorrência no setor.
A geração distribuída no país ultrapassou os 21GW no último mês de maio 235. Ao todo são quase dois milhões de sistemas solares localizados em residências, indústrias, comércios e toda região onde é possível instalar placas solares.

Figura 2 – Instalação de Placas solares em comunidade no Rio de Janeiro – https://rioonwatch.org.br/?p=45062

Figura 3 – Condominio no Distrito Federal – https://epbr.com.br/brasil-ultrapassa-21-gw-em-geracao-distribuida-de-energia-solar/
A GD apresenta crescimento maior do que todas as outras fontes de geração de energia, à qual duplicou sua capacidade instalada de 2021 a 2022 crescendo de 8,5GW para 17GW, e a estimativa é que seja incorporado mais 8GW ao longo esse ano. O modelo apresentou um CAGR (Compound annual growth rate) – taxa de crescimento anual composto, de 1787% nos últimos 10 anos (2012-2022).

Figura 4 – Gráfico autoral com dados do Valor Econômico – https://valor.globo.com/publicacoes/especiais/energia/noticia/2023/05/31/expansao-solar-traz-desafios-tecnicos-e-de-infraestrutura.ghtml
O Brasil tem demanda para essa quantidade de energia?
A resposta simples é não, ou de forma mais otimista, ainda não. E para entender o motivo deve-se analisar a configuração do consumo energético nacional.
O consumo no primeiro trimestre de 2023 foi de 68.993MW (68,99 GW) médios segundo a CCEE, Câmara de Comercialização de Energia Elétrica. Além disso, o Brasil apresentou um superavit de energia permitindo a exportação de 1.445MW médios para Argentina e Uruguai. Esses valores apresentam 3,4% de aumento quando comparados ao mesmo período no ano passado7.
Dados da EPE – Empresa de Pesquisa Energética apresentam um aumento de consumo de 3,4% da energia para o mês de abril comparado com o mesmo período no ano passado. Liderados pelo mercado residencial que aumentou em 6,1% seu consumo, enquanto a retomada das atividades industriais, principalmente no setor metalúrgico foram responsáveis por 35% do consumo (15.760GWh).8

Figura 5 – Consumo Industrial por Setor – Resenha Mensal do Mercado de Energia Elétrica – 05/2023 – EPE

Figura 6 – Consumo de energia e produção industrial – Resenha Mensal do Mercado de Energia Elétrica – 05/2023 – EPE
Dados apresentados pelo Valor Investe, indicam que a produção industrial para o ano de 2022 ainda não havia alcançado os patamares pré-pandemia e estão 18,5% abaixo do nível atingido em 2011, recorde do período.9

Figura 7 – Produção física industrial por seções industriais (Índice de base fixa com ajuste sazonal – IBGE – https://www.ibge.gov.br/estatisticas/economicas/industria/9294-pesquisa-industrial-mensal-producao-fisica-brasil.html?=&t=series-historicas
O crescimento da atividade industrial do país, principalmente em atividades de base, o que complementará a vocação extrativista e agrícola do país, aumentarão o consumo de energia ampliando a base de consumidores para os produtores, seja no mercado cativo ou no mercado livre. Gerar demanda para toda a oferta será difícil no curto prazo, mas haverá um incremento na concorrência para os consumidores através do mercado livre.
O potencial do mercado livre.
A possibilidade de comprar energia do fornecedor a escolha do cliente ainda é um cenário distante para a maioria dos consumidores. Atualmente o mercado é restrito a 31 mil unidades consumidoras, o que correspondem a 37% de toda energia consumida10 ,existe o potencial de curto prazo, janeiro de 2024, da inserção de mais 11% de consumidores potenciais para o mercado livre. 11Esse movimento gera um Total Addressable Market – Mercado total endereçável, de 32GW médios.
Além disso, dados da CNI, confederação nacional da indústria, indicam que apenas 52% das indústrias de grande porte são consumidoras exclusivas do mercado livre de energia, enquanto para as indústrias de médio e pequeno porte, o número é de 25% e 6% respectivamente.12
Por fim o mercado residencial, e comercial não são atendidos hoje pelo mercado livre. 52% de todo o consumo elétrico do Brasil está restrito as distribuidoras no mercado cativo. Com previsão para abertura em 202813 esse movimento mais do que dobrará as oportunidades no mercado de energia.
Mas no final, o que esperar do setor de energia para os próximos anos?
Embora a capacidade instalada seja maior do que a demanda existe no país, o acesso ao mercado livre por 100% das contas abrirá oportunidades para com que os geradores vendam sua energia para todo tipo de cliente. Nesse cenário, os produtores que conseguirem atrair mais clientes verão maiores lucros.
Os preços praticados para o mercado livre apresentam descontos quando comparados com o mercado cativo e mesmo assim ainda são interessantes para os investidores. Para o mês de maio, houve alta em 25% do volume negociado no mercado livre de energia quando comparado com o mesmo período do ano passado14 e como dito anteriormente, ainda existem 3.000 projetos de energia renováveis no pipeline para aprovação ou conexão com a rede.
Há um futuro muito promissor para o mercado com a abertura para a maior participação privada e para maior autonomia do consumidor que poderá escolher de quem deseja comprar sua energia, ou até virar autoprodutor.
Fontes dos dados:
3 – https://www.bnamericas.com/pt/analise/a-crescente-fila-de-projetos-de-energia-renovavel-no-brasil
4 – https://www.theglobaleconomy.com/rankings/electricity_production_capacity/
5 – https://epbr.com.br/brasil-ultrapassa-21-gw-em-geracao-distribuida-de-energia-solar/
6 – https://www.abgd.com.br/portal/geracao-distribuida-deve-crescer-cerca-de-8-gw-em-2023-aponta-abgd/
8 – EPE – Resenha Mensal do Mercado de Energia Elétrica ANO XVI • Número 188 • Maio de 2023
9 – https://valorinveste.globo.com/mercados/brasil-e-politica/noticia/2023/01/05/com-producao-de-lado-atividade-industrial-no-brasil-segue-com-tendencia-negativa.ghtml
10 – https://www.gazetadopovo.com.br/parana/abertura-mercado-livre-competitividade-comercializadoras/
12 – https://noticias.portaldaindustria.com.br/noticias/infraestrutura/56-das-industrias-do-mercado-cativo-desejam-migrar-para-o-mercado-livre-de-energia/